domingo, 9 de março de 2014

Pelos caminhos do deserto

O tempo quaresmal muito me sugere. A princípio me surpreende, mesmo que não seja novidade, mas sempre me traz um novo clima, clima meio desprovido de tantas cores e expressões, sem flores e aleluia. Inicia-se com as cinzas, lembrando-me que sou pó, efêmero e passageiro. É tempo de deserto e como é próprio deste, a temperatura de dia, escaldante quase que insuportável, e a noite, um frio aterrador; tempos de provações, de dureza e tentações. Tempos de preparar decisões, e não de decidir. Tempo onde caminhar é preciso, ainda que devagar, do contrário, logo faltam os sentidos. Há um fato fundante: o Espírito conduziu Jesus até ao seu tempo quaresmal. Ele foi à minha frente. Ele provou do quão árduo é o deserto, quão inóspito, mas sugestivo... Passou pelos caminhos das tentações, mas a elas não cedeu. Tempo de preparação, do plantar ainda que em lágrimas, de cavar os buracos para as grandes estruturas das grandes obras que o Pai quer levantar. Este é um tempo em que o mundo e suas seduções, em nome do imediatismo,
insiste em ignorar. É considerado louco aquele que espera, que padece, que renuncia ou faz penitências. Fora da realidade, antiquado e alienado aquele que para,  se prepara, reconhece suas culpas, pede perdão... 
A cada ano, este caminho se apresenta aos homens. Engraçado que todos os sinais nele contidos jogam luz sobre a realidade. Na vida, para quem crê ou não, o tempo das privações, da dor, das tentações e das preparações sempre se apresenta. Quaresma é isto: é poder viver o que é próprio da vida humana. Isso fez Jesus. Pisou o nosso chão, caminhou sob nosso sol, sentiu nosso frio e foi tentado às coisas más como todo ser humano. E teve fome, ou seja, teve ausências! Por isso, Quaresma me sugere o que de melhor preciso viver: minha humanidade, com suas ausências ou não, com seus acertos e erros. E como fez Jesus, é tempo de caminhar, adentrar ao deserto, o Espírito me conduz, para, como sempre, me surpreender.